O homem estava pegando as chaves do carro (a mulher já tinha saído para levar as crianças à escola) quando tocaram a campainha.
Vagamente irritado, pois já se atrasara bastante, ele abre a porta:
- Sim?
O rapaz alto e estranho, andrógino, belo e feio, alto e baixo, negro e loiro, faz um sinalzinho dobrando o indicador:
- Vim buscar você.
Não era preciso explicar, o homem entendeu na hora: o Anjo da Morte estava ali, e não havia como escapar. Mas, acostumado a negociações, mesmo perturbado ele rapidamente pensou que era cedo, cedo demais, e tentou argumentar:
- Mas, como, o quê? Agora, assim sem aviso sem nada? Nem um prazo decente?
O anjo sorri, um sorriso bondoso e perverso, suspira e diz:
- Mas ninguém tem a originalidade de me receber com simpatia nesse mundo, ninguém nunca está preparado? Está certo que você só tem 40 anos, mas mesmo os de 80 se recusam...
O homem agarrou mais firme a chave do carro, que afinal encontrava no bolso do paletó, e insistiu:
- Vem cá, me dá uma chance.
O Anjo teve pena, aquele grandalhão estava realmente apavorado. Ah, os humanos... Então teve um acesso de bondade e concedeu:
- Tudo bem. Eu te dou uma chance, se você me der três boas razões para não vir comigo desta vez.
(Passava um brilho malicioso nos olhos azuis e negros daquele Anjo?)
O homem aprumou-se, claro, ele sabia que ia dar certo, sempre fora bom negociador. Mas quando abria a boca para começar sua ladainha de razões, muito mais que três, ah sim, o Anjo ergueu um dedo imperioso:
- Espera aí. Três boas razões, mas... não vale dizer que seus negócios precisam ser organizados, sua família não está garantida, sua mulher nem sabe assinar cheque, seus filhos nada sabem da realidade. O que interessa é você, você mesmo. Por que valeria a pena ainda te deixar aqui por algum tempo?
Lya Luft
Contribuição: Leonardo Lacerda
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